"Quarta-Feira"
Então,
ficou para quarta-feira. Mas estava chovendo. Chovendo forte. A vontade de
falar um palavrão era imensa, gritava em meu peito, mas sabia, de antemão, que
me traria problemas se as pronunciasse. Estava buscando a paz de espírito
depois de quarenta anos peregrinando por montanhas de ilusão.
A
ideia de estar se comunicando com um anjo pelo Facebook parecia um filme
francês do futuro. Um neo-realismo, italiano, um Godard ou coisa assim. Algo,
no mínimo, incomum. Inusitado. Metafísico. Um ser celestial cheio de luz.
Esse
espírito se apresentou na rede social. Veio atender minhas orações. Em meio à
tanta coisa, muita informação, muitos bits, bytes, a pressa, várias coisas
acontecendo ao mesmo tempo. Todo mundo conectado. Buscava um treinamento
espiritual.
Então,
em meio àquele mundo virtual, eu encontrei uma ponte entre o mundo que vivemos
e o mundo que é feito da matéria que se constroem os sonhos. O mundo
invisível.
Havia
me programado para sair com antecedência. Essa, medida cautelar, foi muita bem
vinda e acalmou meus ânimos e me deu a possibilidade de reverter uma situação ,
em um momento crítico, para uma outra
possibilidade. Me arrumei e logo saí de casa.
Peguei
meu capote, um velho casaco de couro, coisa de estimação, era como o casaco de
couro de cobra do Sailor, o personagem de um filme, "Coração
Selvagem", do David Lynch.
Subi
na minha motocicleta e desci pela avenida Dobro a esquina, sinaleiro fechado. O
céu está cinza. rajadas e estrondos no ar. Barulho de trovão.
Relampejando.
Uma
chuva fina e chata , de forma constante, incomodava os olhos, mesmo com o
capacete, sentia o tal do incômodo.
Mas eu havia me comprometido. O tal ser
celestial, um raio de sol em minha vida, brilhava no céu do meu astral. Aquelas
conversas que estávamos tendo, noites a dentro, provocaram algumas mudanças em
mim.
Tanto
no meu comportamento, quanto no fato de me sentir mais calmo , o suficiente,
para administrar as vicissitudes da vida.
Uma condição. Existia uma espécie de condição
para que aquele diálogo pudesse seguir em frente. Aceitei. "Você tem que
apagar nossas mensagens logo depois que ler". Concordei, logo depois e ler
já excluía a conversa. Meu coração, logo, apaixonou-se .
Fui
cativado por aquelas palavras, que fluíam em mim, como a água, como o fogo , a terra e o ar. Além, do espírito.
Indescritível. Só poderia ser mágica. Bruxaria. Sim, meu coração teria sido
enfeitiçado, amarrado, em uma arruda, aos encantos da sua paixão.
Então,
o medo se dissipou, se dissolveu, sumiu no ar, como se nada fosse. Os degraus
da escada me levariam até o céu. Passos
firmes. Respirei fundo. Esperei por um tempo. Olhei de um lado ao outro.
Tudo tranquilo. Peguei o celular no bolso e fiz uma ligação.
Tocou
só uma vez. Disse que estava lá. As portas se abriram ao meu pedido. Minhas
orações estavam sendo atendidas. Vi, na penumbra, sua sinuosa silhueta, seu
corpo esguio, sua aparência angelical. Cativou meu olhar.
Os cabelos cacheados, em um tom vermelho, se escurecia, à meia luz
do jardim secreto. Toda a riqueza da vida, uma fortuna maior que todos os
tesouros do mundo. Sacerdotisa da paz. O meu arcanjo, o meu querubim.
Os seus
olhos irradiaram os meus com sua luz divina que emanava de sua alma
sobrenatural. A presença viva do meu amor. Seu nome era Sophia.
!!!
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